“É que João Brandão foi também ele um enorme corredor, se bem que a cavalo, que corria pela liberdade não só individual mas de todo um povo. E é exaltando esses mesmos princípios de liberdade e solidariedade que hoje corremos.”
João Brandão: memória
João Victor da Silva Brandão nasceu a 01 de Março de 1825 no Casal da Senhora, freguesia de Midões, tendo vindo a falecer em Caata, Angola, em 1880.
Casou em 1863, em Candosa, com D. Ana Eugénia de Jesus Correia Nobre, senhora distinta e de família respeitada na região. Foram seus padrinhos de casamento Roque Ribeiro de Abranches Castelo-Branco e sua esposa. Roque Ribeiro era homem de enorme prestígio, tendo feito parte da Junta Revolucionária que preparou a revolução de 24 de Agosto de 1820 e, pelos seus serviços prestados à causa liberal foi-lhe concedido o título de Visconde de Midões.
Revolucionário e defensor de ideais liberais fez parte, desde 1846 a 1851, de um batalhão dos Cartistas, partido oposto aos Constitucionalistas/Setembristas. “ Era pessoa inteligente e culta. O livro que escreveu demonstra-o. E conseguir quase sempre êxito nas eleições dos deputados que apoiava, também o demonstra. Daí terá vindo a sua desgraça, porque os seus inimigos espreitavam-no.”
De 1849 a 1854 foi vereador e fiscal da Câmara de Midões. Em 1853 é recebido pelo próprio Ministro do Reino, Rodrigo da Fonseca Magalhães, que lhe concedeu grandes poderes para perseguir ladrões e assassinos na Beira.
“Mas as grandes violências da família Brandão do Casal da Senhora e de Midões exerceram-se sobretudo a nível do poder local: eleger deputados, dominar a câmara, ter um bando armado. Isso mesmo se passou por todo o país, embora sem atingir tanta gravidade”.
Entre interesses, perseguições e mortes pouco esclarecidas, no dia 04 de Maio de 1866, vem o Administrador de Oliveira do Hospital a Tábua, Dr. Luís Pereira Abranches, pedir ao colega de Tábua, José Maria das Neves Rebelo Veloso, ordem de prisão contra João Brandão, sem que houvesse qualquer processo contra ele instaurado.
É sob este clima de perseguição política e pessoal que anos mais tarde, na solidão de uma cela, viria a escrever: “
Desde 1828 foi a minha família vivamente perseguida pelo governo dessa época ominosa. Alguns dos meus parentes próximos, culpados e presos como liberais, foram encerrados nos cárceres de Almeida, onde jazeram até que a liberdade vitoriosa terminasse o reinado opressor do despotismo.”
Consequentemente, é preso sem culpa formada, na cadeia de Tábua, atual Biblioteca Municipal João Brandão. Antevendo um julgamento dúbio, é transferido para o Tribunal da Relação do Porto, ao qual, à data, Tábua pertencia administrativamente.
É posteriormente condenado ao exílio em terras de África, onde mereceu, durante certo tempo, de estatuto especial, tendo apenas de se apresentar regularmente às autoridades e não podendo ter bens em seu nome. Conferindo-lhe o estatuto de homem astuto e empreendedor, rapidamente se rodeou de pessoas que lhe possibilitaram o começo de uma nova vida e de novos negócios.
Todavia, talvez pelos ecos do seu renascimento, a 17 de Maio de 1880 chega à sua província angolana um novo governador, o Conselheiro João das Neves Ferreira Júnior, que traria ordens para o aniquilar de vez. E assim nesse mesmo ano aconteceu.
João Brandão: território e província da Beira Alta
Sempre se afigurou personalidade primeira da história contemporânea de Tábua, passando a fronteira da esfera regional, para se tornar inclusivamente personagem do imaginário do próprio país. Não é, portanto, por mero acaso que as referencias a João Brandão se estendem de norte a sul do país – manifestas não só na nossa cultura popular, através de lendas e cantigas, contos e literatura, mas na cultura popular do todo um país.
Neste sentido, e sendo também João Brandão um homem com responsabilidades políticas na então Câmara de Midões, será consensual afirmar-se que era profundo conhecedor do atual território que constitui o concelho de Tábua, mas também os concelhos de Arganil, Oliveira do Hospital, Seia, Santa Comba Dão, Coimbra, Guarda, Covilhã e muitos outros que, por diferentes motivos surgem na referida cultura popular do país.
Todavia, apesar de existirem bastantes referências ao território, entenda-se, cidades, vilas ou aldeias, as referências a sítios e locais são manifestamente poucos. No entanto, há bastantes referências a Tábua, pois foi aqui que se procedeu ao seu famoso julgamento.
Desta forma, tomamos como certo que João Brandão conhecia bem o que é hoje a vila de Tábua e alguns dos seus lugares, uma vez a nossa cultura popular local lhe vai fazendo referência.
Surgem assim os seguintes lugares na vila de Tábua:
- Biblioteca Municipal, à data Tribunal, local onde João Brandão foi julgado, considerar para o efeito toda a rua Dr. Francisco Beirão;
- Capela Senhor dos Milagres, pois como cristão que era, aqui viria nem que de passagem, que vem no prolongamento da rua Dr. Francisco Beirão e conduz à
- Pedra da Sé, segundo a tradição oral João Brandão muitas vezes se escondeu, sozinho ou acompanhado do seu bando.
Neste sentido, há todo o mérito em associar esta figura primeira a um evento deste género. É que João Brandão foi também ele um enorme corredor, se bem que a cavalo, que corria pela liberdade não só individual mas de todo um povo.
E é exaltando esses mesmos princípios de liberdade e solidariedade que hoje corremos.